Analisamos a difícil, mas recompensadora, jornada de adaptar as projeções do “Caminho Suave” para a realidade sem kimono do MMA amador.
Poucas coisas no mundo das artes marciais são tão visualmente espetaculares quanto uma projeção perfeita de Judô. A imagem de um lutador usando o peso e o momento do oponente para arremessá-lo ao chão com força e controle é a mais pura expressão de técnica sobre a força bruta. Nomes como Ronda Rousey e Rick Hawn levaram essa arte ao mais alto nível do MMA, provando sua eficácia.
Mas para o lutador amador que passa horas no tatame aprimorando seu O-goshi ou Harai-goshi segurando um kimono, a transição para o octógono pode ser um choque de realidade. A pergunta que ecoa em muitas academias é: sem a pegada no gi, o Judô ainda é uma arma de elite para o MMA de base?
O Grande Desafio da Transição: Adeus ao Kimono
A principal dificuldade para qualquer judoca no MMA é a ausência do judogi (kimono). A maioria das quedas e projeções do Judô dependem fundamentalmente das pegadas na gola (lapela) e na manga para quebrar a postura, desequilibrar e executar o arremesso. Sem o kimono, o judoca enfrenta problemas imediatos:
- A Falta de Pegadas (Grips): As pegadas confiáveis simplesmente não existem. O suor e a ausência de tecido tornam o controle do tronco e dos braços do oponente uma tarefa escorregadia e difícil.
- A Distância do Striking: O Judô é praticado em uma distância de agarre (clinch). No MMA, essa distância precisa ser encurtada através de uma zona de perigo cheia de socos e chutes. Aproximar-se para aplicar uma queda de quadril sem ser nocauteado é o primeiro grande obstáculo.
- A Postura do MMA: A postura de um lutador de MMA é mais baixa e agachada, similar à do Wrestling, para defender quedas e otimizar a movimentação. Isso torna muito mais difícil para o judoca entrar por baixo do centro de gravidade do oponente, uma necessidade para a maioria das projeções de quadril.
A Solução: Adaptando o “Caminho Suave” para o Cage
A boa notícia é que o Judô não é inútil; ele apenas precisa ser adaptado. Os princípios de desequilíbrio (kuzushi) e alavancagem ainda são universais. O judoca inteligente aprende a encontrar novas “pegadas” no corpo do adversário.
- Dominando o Clinche (Overhooks e Underhooks): Em vez de buscar a gola, o judoca deve se tornar um mestre no controle de esgrima. O
overhook
(braço por cima do braço do oponente) e ounderhook
(braço por baixo) se tornam suas novas “mangas e golas”. A partir do controle de umunderhook
forte, é possível aplicar versões adaptadas de quedas como o O-goshi (grande projeção de quadril). - Usando a Grade como Aliada: A grade do octógono é a melhor amiga do judoca. Pressionar o oponente contra a grade limita sua movimentação e cria a oportunidade perfeita para controlar a parte superior do seu corpo, desequilibrá-lo e aplicar uma variedade de quedas, como o Harai-goshi (varrida de quadril).
- Foco em Varridas e Raspagens (Ashi-waza): Técnicas de pés, como o O-soto-gari (grande ceifada exterior) e o Ko-uchi-gari (pequena ceifada interior), são mais fáceis de aplicar sem o kimono, pois dependem menos da pegada e mais do timing e do desequilíbrio. Elas são excelentes para desestabilizar um striker.
- Controle de Punho: O controle de punho (wrist control) no estilo “2-em-1” é outra adaptação crucial, permitindo ao judoca manipular o braço do oponente de forma similar ao controle da manga.
Vantagens no Cenário Amador
Mesmo com os desafios, uma base de Judô oferece vantagens únicas no circuito amador:
- Equilíbrio Superior: Judocas possuem um senso de equilíbrio e uma base quase inabaláveis. Eles são extremamente difíceis de serem derrubados ou varridos.
- Quedas de Alta Amplitude: Diferente das quedas de Wrestling, que muitas vezes resultam em uma “briga” no chão, as projeções do Judô são frequentemente de alta amplitude, fazendo o oponente cair diretamente em posições de desvantagem (como de lado ou até de costas), abrindo caminho para o ground and pound.
- O Fator Surpresa: Muitos lutadores amadores treinam para defender o double leg do Wrestling, mas não estão preparados para a mecânica de uma projeção de quadril ou uma varrida de pé.
Conclusão:
O Judô no octógono amador é, sem dúvida, eficaz, mas não em sua forma pura. Ele exige que o atleta seja um solucionador de problemas, que traduza os princípios atemporais de sua arte para a linguagem moderna do MMA.
O judoca que se recusa a adaptar suas pegadas e seu jogo de distância terá imensa dificuldade. Mas aquele que abraça o clinche, usa a grade e adapta suas projeções, se torna uma força a ser reconhecida, capaz de encerrar uma luta com uma queda tão plástica quanto devastadora.
Você tem experiência com Judô no MMA ou já enfrentou um judoca no cage? Como você vê essa transição? Deixe sua opinião nos comentários!